terça-feira, 11 de agosto de 2020

11 DE AGOSTO DE 1944



Enfermeira da FEB (Elza Ferreira Vianna) provavelmente em Marrakech
Acervo CD II Guerra APV

 Elza Ferreira Vianna (à direita) e demais enfermeiras provavelmente em Marrakech
Acervo do CD II Guerra APV


Enfermeira Marina Franco Moura (?) provavelmente em Marrakech
Acervo do CD II Guerra APV

Página 11 do diário manuscrito de Altamira

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11-8-44 - sexta-feira. Levantar vôo- No melhor do sono tivemos que levantar e vestir etc. em 20’. Nos vieram buscar para o Breakfast (pão, presunto, manteiga, maça) café- leite (felizmente o café estava melhorsinho. Antes tomei o (remedio = 8640)-A agua horrorosa (muito chloro). Depois de tudo legalisado só ás 6hs20’ partimos- Um calor terrível-Tudo telado-O maximo de cuidado com as moscas – Fébre- Não é permitido estar em certos logares de Dackar (doenças venereas)-Os negros em geral com muita doença. Primeira cidade que não tivemos despesas!


Página 12 do diário manuscrito de Altamira

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Houve um desarranjo na hélice e tivemos que descer ainda na base (graças á Deus!)_Voltamos ao café. Ás 8hs10’ nova flitagem (é horrível o cheiro)! Pela 1ª vez viajamos as 7 sosinhas, só com os pilôtos. Muita bagagem (correio). São 186 sacos grdes +- de correspondência !?_São 11hs00- quando q. haviamos de pensar que iriamos atravessar o “Deserto do Sahara”.- Ele se apresenta a princípio arenoso (porem, sólido), com misera vegetação ou pedregulhos (do alto tem-se a impressão de pontilhados). As miragens são incontaveis! São verdadeiros lagos azul claro! Só mesmo vendo para avaliar o suplício de Tântalo dos infelizes que se perdem aqui._Depois, se torna em um vasto lençól de areias soltas, movediças, ondulantes. Conforme a direção do vento, formam-se elevações semelhantes á cordilheiras_ Já nem ao menos existe a miragem. É um perfeito céo de nuvens compactas. ____ Hoje, estou fazendo uma bôa viagem, não sinto nada. É um céo na terra e no ar, mas que céo?!! São 11hs30’ – o deserto agóra óra é uma verdadeira cordilheira de tenebrosas montanhas de areia; umas, brancas, como nuvens; outras escuras como pedras e rochas. O avião já está descendo_ Isto aqui é peor que o céo, a terra, o mar, o inferno!!!!!! __________________A região é um ligeiro Oasis, plana, ora rochosa.
Ás 11hs40’ descemos para a base. O vento sufóca – o calôr é extremo_Aqui é ATAR – Orange- região de

Página 13 do diário manuscrito de Altamira

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Marrócos. O majór de base (1 casinha pequena – em pleno deserto) diz que hoje até está frio_ É um pessoal heróico! Não ha nada para se comer_a agua, a mesma. Ha negros soldados francêzes com “fês vermelho”. Ha meninos arabes, pretos do sól, mas, bélos de traços – cabelos negros e ondulados como os nossos, olhos brilhantes escuros _e dentes alvos e belos_ Trouxe como lembrança, 1 lencinho com areia quente. Ás 12hs,15’ tornamos a subir _Vê-se as casas (brancas de telhados de aluminio ou flandres. Ha 1 sinagoga ou minarete. O calôr é demais _ _ _ _ _ Vou tirar toda a roupa que puder. A tinta que borrou, secou imediatamente tal o calor e pressão do ar. 13hs00’ – acabei de fazer uma misera refeição racionada (pão – carne condimentada (que não tive a coragem de comer), mas guardei para alguem que queira .– Um pouco de caldo de vitamina (abacaxi – já estou cheia de espinhas). Não me sinto bem – tomei meu remédio para garantir. As bases são cada vez mais pobres e terriveis! O deserto é medonho! O calor excede á tolerancia de quem não está acostumado. As meninas estão virando homens – arregaçaram as calças e mangas – abriram as camisas e estão descalças. Em todo o caso nas alturas é sempre melhor_A privada é o local + fresco.Não tendo nada que fazer resolvi contar os sacos de correspondencia de guerra +- 186 (dos grandes) com etiquetas codificadas por abreviações e numeros. Só temos conosco o embornal. Os sacos e malas



Página 14 do diário manuscrito de Altamira

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 nossos penso que estão num deposito externo.São 16hs40’- o deserto continua-Está esfriando_Estamos +- a 3,500 metros de altura. Aqui é rocha pura. Ha uma infeliz base. A natureza borda os mais variados arabescos, entre elevações e vales rochosos. Infeliz daquele que cair aqui. Vê-se uma longa e estreita estrada de todos os contornos até se perder de vista. 17hs00 – Heis o grande Oásis de Marrócos – o filete de agua brilha superando toda a tristeza. As montanhas já são recobertas por ligeira vegetação. Estamos muito alto. Sinto muito frio – meus ouvidos estalam. Ha montanhas elevadíssimas_ O avião jóga muito, temos que nos prender. Descemos ás 18hs’30 em Marrakech. Daqui um tal Willian D. Sorrison mandou lembranças para Jorge Martins Teixeira Bolivar. AIR BASE FEL 1515 TIME HERE G.M.T. PLUS 1 HOUR U.S.A.A.F.
É a maior base até aqui- Vê-se o solo forrado de aeroplanos de guerra. Ha prisioneiros italianos- Subimos ás 18hs45’. So tomei agua gelada chlorada (outras tomaram toddy). Zona de guerra. Ha mais conforto e ha vegetação. É posseção franceza de Marrócos. É grande e tem tudo +- bem delineado. Chegámos em Casa Blanca ás 21hs50’. Bela cidade. Teatro de guerra. É pena que não se póde ver nada. “Black aut”. Trocamos 10 dollares em francos mas não pudemos comprar nada. Jantámos na propria Cantina. Retiramos bagagem, perdi um cadeado- Fomos de onibus oficial para o Hotel Atlantic. Cidade toda ocupada por militares. Não tivemos despesa alguma. só pagamos 7 cents = 2$800 ao garçon arabe do Hotel. situado em Bowlevard de La Gare. Eu, no qto 11- 2º andar. Infelizmente  não
VIDE 2 FÓTOS (BOW e HOTEL)

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ficaremos em Casablanca. Só por algumas hóras para conhece-la.Temos que partir ainda esta noite. Tomei um banho. Eu, Bertha e Sylvia assim mesmo démos uma volta pela cidade, no escuro. O pessoal do cinema é conduzido em caminhões. Só com os faróes dos autos conseguimos ver alguma vitrina: Belas bolsas – roupas de lã em tricô- muitas facas_ arabes dormindo pelas calçadas. Belas residências arabes. A avenida “Boulevard Du 4º Lonaves” é linda arborisada de lindas e interessantes palmeiras: belas mosquiotes e muiaretos. Não fômos dormir porque não valia a pena, apesar de cansada nem deitei-me, não havia tempo.


TRECHOS DO DIÁRIO DATILOGRAFADO POR ALTAMIRA PÓS GUERRA

11-8-44- 6ª.feira-Dakar:-No melhor do sôno, ás 4hs,00 da madrugada, tivemos que levantar, vestir, etc, em 20’minutos. Vieram nos buscar para o breakfast: pão, presunto, manteiga, maça- leite; felismente o café estava melhorzinho. Antes, tomei o remédio (8640), agua horrorosa (muito chloro). Um calôr terrível. Tudo telado. O máximo de cuidado com as moscas: febres. Não é permitido estar em certos logares de Dakar (cancro venéreo); os negros em geral com muitas doenças.
Tudo legal, partimos ás 6hs,20’. Primeira cidade que não tivemos despesas; - Houve um desarranjo na hélice e, tivemos que descer, ainda na base, graças á Deus! Ás 8hs,10’, nova flitagem (é um cheiro horrível).
*Pela 1ª. vês, viajamos as 7 sosinhas, com os pilotos e muita bagagem (correio).


Avião de guerra com 2 longos bancos laterais de metal aluminizado puro!
Trajeto de Dacar a Atar


-DESERTO DO SAHARA-
São 11hs,00- quando que havíamos de pensar que iriamos atravessar o “Deserto do Sahara”, sozinhas, em tempo de guerra?
Ele, se apresenta á princípio arenoso, porém sólido, com mísera vegetação ou pedregulhos (do alto, tem-se a impressão de: pontilhados). As miragens, são incontáveis- são verdadeiros lagos, azul-claros! Só mesmo vendo para avaliar o suplício de “Tântalo”, dos infelizes, que se perdem aqui. Depois, se transforma em vasto lençol de areias soltas, movediças, ondulantes, levadas pelo vento. Formam-se elevações semelhantes ás cordilheiras. Já nem au menos existe a miragem- É um perfeito céu de nuvens compactas.
Hoje, estou fazendo uma bôa viagem, não sinto nada. Parece um céu, na terra e no ar, mas que céu?!!!
São 11hs30’ – o deserto agora é uma perfeita cordilheira de tenebrosas montanhas de areia: umas brancas como nuvens; outras escuras como pedras e rochas. Isto aqui é pior que o céu, o ar, a terra, o mar, o inferno!!!!!! É o belo horrovel! O avião já está descendo- a região é um ligeiro Oásis, plana.


- ATAR- Marroco –
Ás 11hs,40’, descemos em Atar – é a menor base aérea que já vi – só mesmo numa guerra- não existe mais nada, apenas este barracãosinho, em pleno deserto incomunicável- só mesmo pelo avião, poderiam ter se localizado alí. O vento sufoca – o calõr é extremo- região de Marrocos- Não há nada para se comer. A água,para se beber, a mesma chlorada, depositada num saco de lôna impermeável, com uma torneirinha. O major comandante, desta base, diz que hoje até está frio! É um pessoal heroico! Alguns negros, soldados francêses, com fêz vermelho- meninos árabes,quasi pretos, tisnados pelo ardente sol mas, bélos de traços: cabelos negros e ondulados, olhos escuros e brilhantes, dentes alvos e perfeitos como pérolas.
Trouxe como lembrança, um lencinho (que achei lá- parece mentira, mas isto é que é sorte), amarrando um punhado desta arêa ainda quente. Ás 12hs,15’ tornámos a subir. Tudo se modifica- Vêm-se casas brancas com telhados de alumínio ou flandres- Há uma sinagoga ou mirante. O calôr é demais......................vou tirar toda a roupa que puder. A tinta, que borrou, secou imediatamente, tal o calôr e pressão do ar. 13hs00– Acabei de fazer uma mísera refeição racionada: pão, carne condimentada, de lata (que não tive a coragem de comer), mas guardei para alguém que queira; um pouco de caldo de vitaminas (abacaxi); já estou cheia de espinhas. Não me sinto bem– tomei meu remédio para garantir. As bases, são cada vês mais pobres e terríveis. O deserto é medonho! O calôr excede á tolerancia de quem não está acostumado. As meninas (colegas) estão virando homens: arregaçaram as calças (compridas), e mangas– abriram as camisas e, estão descalças. Em todo caso, nas alturas é sempre melhor. Dentro do avião, o local mais fresco, é a cauda, mas está instalado o “gabinete”. Para me distrair, resolvi contar os volumes da enorme correspondência: são mais ou menos 186 (sacos dos grandes), com etiquetas codificadas, por abreviações e números.
Só temos conosco, o embornal- os sacos e malas, penso que estão num depósito externo. São 16hs40’- o deserto continua. Está esfriando- estamos muito alto, creio que á 3.500 metros (ou pés?), de altitude. Há uma infeliz base, lá em baixo, na rocha pura. A natureza borda os mais variados arabêscos, entre elevações e vales rochosos. Infeliz daquele que cair aqui. Vê-se uma longa e estreita estrada de todos os contornos, até se perder de vista.
17hs,00 – Heis o grande “Oásis de Marroko”: o filete de agua brilha, superando toda a tristesa- as montanhas são já recobertas por ligeira vegetação. Estamos muito alto, sinto muito frio– meus ouvidos estalam. Ha montanhas elevadíssimas. O avião jóga muito- temos que nos prender. Ás 18hs,30’, descemos em:

Trajeto de Atar a Marrakech

Trajeto de Marrakech a Casa Blanca



-MARRAKECH-
AIR BASE FEL 1515 TIME HERE G.M.T. -PLUS 1 HOUR. U.S.A.A.F.-
É a maior base até aqui. Vê-se o sÓlo forrado de aeroplanos de guerra. Zona de guerra- prisioneiros italianos. Tem tudo bem delineado, conforto e alguma vegetação. É posseção francêsa. Só tomei agua chlorada gelada; as outras tomaram toddy. Nesta base, Willian Do Sorrison, mandou lembranças para: George Martins Bolivar (si o encontrar?!). Subimos ás 18hs,45’.  


Trajeto de Marrakech a Casa Blanca


-CASABLANCA-
Chegámos em Casablanca ás 21hs,50’. -Teatro de guerra. O aeroporto repleto de aviões. É pena que não se pode ver nada- “black-aut”. Trocámos 10 dollares por francos, mas não pudemos comprar nada. Jantámos na própria Cantina- Retiramos bagagem: perdi um cadeado. Fômos de onibus militar para o Atlantic Hotel, situado em Bowlevard de La Gare nº.
Ocupei o quarto nº. 11 (onze), do 2º. andar. Pobre de mim, pensei que soubesse alguma cousa do francês, pois assim me garantiram e, quando chegou a hora de falar ao empregado árabe, para levar minha bagagem, ao quarto, não saiu uma só palavra! Salva-me com a mímica. Infelizmente não demoraremos em Casablanca para conhecê-la; só por algumas horas. Temos que partir ainda esta noite. Nos preparamos. Bertha, Sílvia e eu, resolvemos dar uma volta, assim mesmo no escuro. _Bela cidade, porém toda ocupada por militares. O pessoal do cinema é conduzido por caminhões; só com os faróis dêstes, conseguíamos ver alguma vitrina: bolsas–roupas de lã ou tricô- muitas facas- árabes dormindo pelas calçadas- Belas residências. A Avenida “Boulevard Du 4º Zowaves” é linda, arborizada com interessantes palmeiras: belas mesquitas e minaretes.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS: 


O manuscrito original do autointitulado “Diário de Guerra” - nome que a própria autora (Altamira) dá ao seu diário, encontra-se sob a guarda permanente do “Centro de Documentação da II Guerra Mundial Cap. Enf. da FEB Altamira Pereira Valadares” e possui dois volumes de encadernação simples. O primeiro compreende o período de [28/08/1944 com excertos desde o dia 04/08/1944 a 28/04/1945] e o segundo volume, de 29/04/1945 a 22/08/1945. Além dos dois volumes manuscritos,  Altamira datilografou o que ela chamou de livro com a sugestão do título ”Febianas”, numa releitura pessoal entre os anos de 1961 a 1970. Foi nesse livro datilografado que a autora inseriu fotos, cartas, desenhos, etc. já com desejo de publicação de seus relatos. Vale ressaltar que entre os diários manuscritos e o livro datilografado há supressão ou acréscimo de impressões e relatos.

Nota do Centro de Documentação: O texto datilografado por Altamira foi transcrito com a atualização da ortografia, mantendo a integridade das palavras e pontuações, mesmo quando aparentemente foram utilizadas de forma equivocada pela autora.

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