sexta-feira, 31 de julho de 2020

CURSO DE EMERGÊNCIA DE ENFERMEIRAS DA RESERVA DO EXÉRCITO - "C.E.E.R.E."

Texto Datilografado elaborado pela própria Altamira visando 
publicá-lo como livro, em três partes:

I-ANTES DA GUERRA
II-DURANTE A GUERRA (a partir de seu diário manuscrito)
III-APÓS GUERRA

Grupo de Enfermeiras do C.E.E.R.E. na aula de Educação Física
22 de março de 1944 - Forte São João (Rio de Janeiro)
Acervo do Centro de Documentação APV doado pela Agência Globo



(PARTE I)
“CURSO DE EMERGÊNCIA DE ENFERMEIRAS DA RESERVA DO EXÉRCITO”
“C.E.E.R.E.”

     Teve início no dia 1º de Fevereiro de 1944, 3ª feira, às 14 horas/ no Auditório da “D.S.E.”, sendo inaugurado pelo Exº. Cel. Méd. Dr. João Afonso de Souza Ferreira, na presença do nosso Diretor da 1ª Turma, Major Méd. Dr. Augusto Marques Torres, possuidor de profundos conhecimentos profissionais, educacionais e militares.
     Constou das seguintes matérias: Prática hospitalar de enfermagem-/ Educação física (Sessões de 30’) - Ordem unida (sessões de 30’) - Serviço de Saúde em Campanha – Hierarquia militar, disciplina, sinais de respeito, Regulamentos Militares- Cirurgia de guerra- Higiene e profilaxia.
     As aulas teóricas:-Matéria militar, Serviço saúde em campanha, Cirurgia de guerra, epidemiologia e profilaxia anti-infectuosa, principalmente em campanha, e diversas Conferencias, todas no auditório da D.S.E.
     As aulas práticas, durante os estágios nas enfermarias, salas de operações, das diversas clínicas do Hospital Central do Exército (H.C.E.) e Policlínica Militar (P.M.), em Moncorvo Filho.
     As aulas de Educação Física, na Escola de Educação Física do Exército, no Forte São João (URCA).
     As aulas de Ordem unida, no Colégio Militar, Rua Francisco Xavier.
     E, assim num ritmo aceleradíssimo, chegávamos às provas finais, exatamente a 11 de Março.
     Este curso foi intenso estafante, no curto prazo de seis semanas, /dada a urgência que a guerra exigia. E, diga-se de passagem muita coisa desnecessária, pois numa guerra moderna não havia aplicação.
     Com muito esforço, boa vontade e todos os sacrifícios, havíamos vencido esta dura etapa, lutando ainda com o curto espaço tempo entre distâncias enormes e transportes difíceis. Às vezes, fazíamos as refeições no restaurante da Central, mediante cartão do Exército, para ganhar tempo. Era uma correria insana, desde bem cedo, para o H.C.E., lá nos confins do mundo pela manhã e, deste para casa almoçar, quando se conseguia condução logo, ou então para o restaurante da Central; desta para o auditório da D.S.E.; daí para o Forte de São João. Parece-me que às vezes recebíamos passes para as conduções?
     Quase sempre chegava em casa, exausta e com o corpo dolorido da ginastica etc., que era preciso tomar um bom banho com sal grosso (cloreto); uma boa refeição e muito repouso, para no dia seguinte recomeçar. Eu, morava no centro da cidade, imaginem que algumas colegas moravam em Carmo Grande, outros distantes subúrbios da Central e em Niterói.
     Um dia resolvi e fui falar com Exmo. Diretor de Saúde do Exército. Expus que, em vez de estar perdendo energias e repetindo o que já vinha exercendo há muito, poderia isentar-me desta frequência e estágios (pois sabia que alguém gozava desse privilégio), poderia fazer então um estágio mais proveitoso e útil de adaptação, nos U.S.A. que viesse beneficiar a nós mesmas em campanha. Ele respondeu que: isto era impraticável, desnecessário e também não havia tempo. Não me reconheceu, nem me lembrei de dizer-lhe que já havia sido sua aluna. Sentia-me desarvorada, desambientada dentro do Exército, como num mar encapelado, sem tomar pé sem poder nadar, nem mesmo boiar. A única pessoa que poderia me referenciar já havia partido, antecipando à Força, preparando no T.O. funcionamento do S.S. da “FEB”. Não há de ser nada, hei de vencer. Confiava em mim, mas isto não era suficiente, bem que notava algo velado.
     Deste modo se formou a primeira turma, aqui no Distrito Federal, as desbravadoras, graças também aos nossos dirigentes e professores, os desbravadores e, à DEUS!
     Assim nos libertamos das Hebertélas do Major Marques Torres, mas, o Entendidos do 1º Ten. Médico Dr. Fernando Mangia, continuariam!...
     Dentre os muitos professores que nos instruíram, quero salientar de preferência, os que também estiveram além-mar, sem contudo desfazer dos que ficaram e dos que mesmo fizeram nas diversas Regiões Militares, mesmo porque, não consegui todos os nomes.
     Além dos citados anteriormente:-Majores Médicos, Drs. Azaias Duarte, Professor Agenor, Edesio de Estelita Lins; Capitães: Abelardo Raul de Lemos Lobo, Nelson Bandeira de Melo, Godofredo da Costa Freitas e Generoso de Oliveira Ponce. Tenentes Médicos: Dr. Fernando Mangia...
Mesmo assim não me é possível lembrar dos nomes dos demais e saber das turmas seguintes nas diversas Regiões Militares, aos quais peço-lhes mil perdões. E a todos eles em geral, em nome das colegas, o nosso sincero agradecimento.
     O “Diário de Notícias” do dia 26 de Março de 1944, de acordo com o Boletim das armas à pág. 10, tornou público o seguinte:-
As primeiras enfermeiras que vão acompanhar as Forças Expedicionárias Brasileiras concluíram os seus cursos.

“O Curso de Emergência de Enfermeiras da Reserva do Exército, dirigido pelo professor major dr. Augusto Marques Torres, acaba de tornar público a relação nominal das jovens que concluíram com aproveitamento os seus estudos e que serão dentro em pouco incluídas no respectivo quadro criado pelo governo. Essas novas enfermeiras da reserva, que vão ser distribuídas pelas unidades de tropa das Forças Expedicionárias Brasileiras, são as seguintes, por ordem de merecimento intelectual:

Nota:- Para não estar aqui e mais adiante dando e repetindo relações de nomes, mesmo porque de princípio não estavam completas, dependendo da conclusão dos cursos das demais, e também sem saber qual a ordem de aproveitamento, darei então no final do Livro, um Quadro Evolutivo Total, completo, em ordem de: 1º merecimento intelectual (1ª Turma); 2º Nomeação a 3ª Classe (todas as turmas), com nº Portaria e data;  3º Convocação com nº Portaria e data; 4º Partida, etc. etc. até a volta, somente das que fizeram a guerra.

E, para que não pensem que desejo esconder minha lamentável situação basta que lhes diga: Imaginem os leitores que fiquei triste mesmo, quando verifiquei que fui classificada nas provas em 41º lugar, eu que sempre fiz tudo para obter primeiro lugar? como? não sei? Senti-me envergonhada perante os que não me conheciam antes, só Deus mesmo sabe como aconteceu isto! Não tem importância, si não me tolherem os passos para servir e provar assim que não sou tão incapaz como enfermeira, quanto o sou como intelectual!
Ainda o mesmo matutino dizia:-“Essas enfermeiras vão receber seus diplomas em solenidade especial que será realizada dentro em pouco, em dia e hora a serem designados”.
Não houve a solenidade especial nem a entrega de diplomas (até hoje), conforme estava marcado para o dia 4 de Maio, devido a motivo que ignoro, talvez a atribulação da guerra que se agiganta. O que importa é que já se podia respirar um pouco, uma vez que o 1º Grupo estava em condições de integrar no primeiro “Quadro de Enfermeiras da Reserva do Exército”, criado recentemente no Brasil.
Deu-se a seguir início à 2ª Turma, do D.F., ainda sob a direção do Maj. Méd. Dr. Augusto Marques Torres, nos primeiros dias, sendo concluída sob a direção do Maj. Méd. Dr. Luiz Paulino de Mello.
Creio que nesta e nas outras turmas que se seguiram, diversas dificuldades foram sanadas, em virtude da primeira experiência. Também tudo se processou com mais calma e segurança, uma vez que já se podia contar no momento com um grupo. Pelo menos receberam seus diplomas e as das outras Regiões Militares.
Em resumo, num total aproximado de 276 candidatas, em todo território nacional, formando 14 turmas, concluíram o curso com aproveitamento 244 alunas.

Nota:- Sobre o “C.E.E.R.E.”, CONVOCAÇÃO, PREPARAÇÃO, Curso de enfermagem de Vôo, Curso de Enfermagem da Força aérea Brasileira, tenho em separado, trabalhos completos (ou seja mais extensos), à disposição do Exército e da “FAB”, para sua Biblioteca, quando o desejarem.

     Neste Curso “CEERE”, pudemos observar que foi constituído na maioria por: Samaritanas, Voluntárias Socorristas, Enfermeiras práticas, Atendentes e, pouquíssimas profissionais da Escola Padrão “Ana Neri”, “Cruz vermelha Brasileira”, Escola “Alfredo Pinto” e Escola de “Enfermagem de São Paulo”.
     As Samaritanas e Socorristas predominaram e quase todas fizeram esses cursos de emergência, com a finalidade de colaborar nesta guerra.
     Portanto estavam em melhores condições físicas, dispostas, sem o cansaço produzido pelo exercício das funções de enfermagem. Também como é natural, quase todas, mais jovens, faltando nelas apenas o conhecimento mais profundo da profissão.
     Não quer isto dizer que as profissionais não tenham acorrido ao referido curso. É que a meu ver, devido às exigências dos seus dispositivos, as tenham impedido. Também a enfermagem é a profissão que mais energias rouba à mulher, e, aquelas que já vem exercendo a espinhosa tarefa quase que fatalmente não poderiam vencer o Curso de Adaptação Militar e trabalhar numa guerra, apesar de sua competência. O nosso País, precisa amparar melhor esta Classe, para que elas se mantenham sempre em condições físicas de desempenhar com saúde e bom humor, a mais bela das Belas Artes: a ENFERMAGEM!

INFORMAÇÕES ADICIONAIS: 

O manuscrito original do autointitulado “Diário de Guerra” - nome que a própria autora (Altamira) dá ao seu diário, encontra-se sob a guarda permanente do “Centro de Documentação da II Guerra Mundial Cap. Enf. da FEB Altamira Pereira Valadares” e possui dois volumes de encadernação simples. O primeiro compreende o período de [28/08/1944 com excertos desde o dia 04/08/1944 a 28/04/1945] e o segundo volume, de 29/04/1945 a 22/08/1945. Além dos dois volumes manuscritos,  Altamira datilografou o que ela chamou de livro com a sugestão do título ”Febianas”, numa releitura pessoal entre os anos de 1961 a 1970. Foi nesse livro datilografado que a autora inseriu fotos, cartas, desenhos, etc. já com desejo de publicação de seus relatos. Vale ressaltar que entre os diários manuscritos e o livro datilografado há supressão ou acréscimo de impressões e relatos.

Nota do Centro de Documentação: O texto datilografado por Altamira foi transcrito com a atualização da ortografia, mantendo a integridade das palavras e pontuações, mesmo quando aparentemente foram utilizadas de forma equivocada pela autora.


Copyright©1994-2020 Centro de Documentação da II Guerra Mundial Cap. Enf. Ref, da FEB Altamira Pereira Valadares. Todos os direitos reservados. Todos os textos e imagens são protegidos por direitos autorais e outros direitos de propriedade intelectual pertencentes ao Centro de Documentação da II Guerra Mundial Cap. Enf. Ref da FEB Altamira Pereira Valadares. 

É proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo sem a prévia autorização do Centro de Documentação da II Guerra Mundial Cap. Enf. Ref da FEB Altamira Pereira Valadares.

Nenhum comentário:

Postar um comentário